Em um momento de mudanças radicais na minha vida, acho que chegou a hora de tentar voltar a escrever também sobre as minhas experiências com o cinema e seu universo de uma maneira mais próxima e mais pessoal. São muitos anos conhecendo lugares e narrativas em tantos formatos, linguagens, cores e idiomas. Neste tempo, tantos encontros e pessoas, amigos que ficaram para a vida, paixões malucas, amores incríveis. Além disso, são muitas viagens e salas de cinema cheias de História e histórias. Ao lado de tudo isso, uma vida paralela descolada, a que cobre as despesas e ocupa uma parte larga da vida, gastando o tempo e desgastando o físico, causando muitas pausas.
Pausas que, nos últimos anos, nunca atingiu dois momentos do meu ano (nem com pandemia): a Mostra de São Paulo, espécie de prova de vida no universo cinéfilo, no final do mês de outubro; e o Olhar de Cinema, um dos festivais que eu vi crescer e do qual eu fazia parte da equipe desde sua quinta edição. Isso até 2014, ano em que não participei do evento. Acontecesse o que acontecesse, eu estava/estou sempre com as férias marcadas para estar presente nos dois festivais. Houve interrupções, mas pontuais. Do Olhar, teve edição em que saí no meio para ser madrinha no casamento da melhor amiga e voltei no dia seguinte; da Mostra, o ano em que peguei o avião de manhã para votar e voltar no memso dia.
Se em São Paulo a relação de trabalho é mais familiar com aquela que eu conheço desde o começo da minha jornada com o jornalismo cultural, porque foi a que chegou primeiro; a em Curitiba lembrava a da vida paralela, mas também tem tudo a ver com o cinema. Fazia assessoria de imprensa, mas estava imersa no meu ambiente, com os meus amigos, conhecidos, respirando cinema e, de certo modo, escrevendo sobre ele. A quebra, em 2023, foi difícil, não só pelo modo, mas pelo vazio que veio com ela também. O ano de 2024 teve um junho que demorou a passar.
Chegou um outro junho e as coisas mudaram de lugar. Todas elas. O meu universo paralelo, que andou ocupando mais tempo e espaço do que o normal ultimamente, passou por uma ruptura inesperada, e abriu espaço para uma movimentação na minha vida, com mudanças incluse de casa e tempo para me dedicar àquilo que eu amo fazer. O cinema volta agora a assumir o protagonismo e, com isso, os festivais voltam de vez à minha vida. As inesperadas segundas férias do ano vieram com dois festivais, porque abril já tinha trazido o Panorama Internacional Coisa de Cinema, uma preciosidade que Marilia Hughes, Cláudio Marques e uma equipe incrível oferecem para gente todo ano em Salvador. São eles a CineOP, no final do mês, e, quem diria, o Olhar de Cinema.
O dia 11 veio com muita ansiedade e chegar em Curitiba foi como voltar para uma casa antiga. Eu conhecia o aeroporto, o frio e os oclinhos que são a marca do festival que me acompanhou tanto tempo. Agora estou aqui como crítica de cinema, na verdade faço parte do júri da crítica, e vou fazer uma coisa que não consiguia fazer antes: assistir aos filmes. O primeiro compromisso era na Ópera de Arame, a abertura com o filme “Cloud”, de Kiyoshi Kurosawa. Enquanto trabalhava no Olhar, aconteceu a primeira abertura na Ópera, mas não pude vir porque estava no meio de um evento gigante sobre Cortes Supremas no tribunal, já de férias, inclusive. Karina, minha parceira em toda essa jornada, esteve sozinha naquele ano de 2012.
Eu voltava então para um mesmo lugar, mas em um espaço que não conhecia. Tudo era maior, mais bonito e mais imponente do que quando eu comecei por aqui. Ver aquela estrutura, Antonio naquele palco enorme e tudo o que o festival virou trouxe um sentimento diferente, um orgulho de ter participado daquilo de alguma maneira, com todas as dores e amores que estão envolvidos nisso. Foi com o coração quentinho, em um frio desesperador, que eu fiquei para assistir ao filme. Longa excelente, que, por acaso, eu já tinha visto ano passado, na época da votação para o Globo de Ouro.
Outra coisa que vale nos festivais e aqui trouxe uma emoção a mais são os encontros. Já no elevador do hotel encontrei um casal que me acolheu lá no começo dessa minha jornada nas coberturas, Maria do Rosário, uma das minhas grandes referências, e Zanin. Com eles, Valente, pessoa que vem lá do passado também e com um monte de história pra contar do Olhar e de outros festivais. Na van, Marcelo Miranda, meu amigo querido, com quem passo horas e horas conversando sobre o ofício e a vida e, lá na Ópera, Aly, que esteve no início dessa história com este festival. Sem falar nos outros tantos colegas e amigos, alguns de tantos e tantos anos, como Pablo, Robledo, Nayara, Orlando, quase todos assessorados por mim aqui.
Foi uma noite especial, olhando para o Olhar de um jeito diferente e muito tocante. Agora sigo aqui no dia a dia. Sinto muita falta da Karina, mas já abracei a Milene, nossa parceira em edições passadas e conheci a Nina, que é a coisa mais linda desse mundo. Também vi as queridíssimas Ray e Eugenia e, volta e meia, me enfurno na sala de imprensa com Max e Felipe (e agora o Diogo), porque a assessoria sai da gente, mas a gente não sai da assessoria. No mais, tô junto com meu amado Chico Fireman, que chegou na sexta-feira, e passo os dias vendo os longas e curtas-metragens da competitiva nacional, deliberando diariamente com minhas companheiras de júri Nayara e Lu; fofocando, rindo e caindo. Porque vocês devem ter percebido a demora para escrever, né? Ela veio por fatores estranhos, estabanados talvez ou, quem sabe, cármicos. Mas isso eu vou deixar para o próximo texto.